Matéria escura e metais nas galáxias (DarkMAGE)

PTDC/FIS-AST/4862/2020
Coordenação:

Jarle Brinchmann

Na teoria prevalecente para a formação estrutural hierárquica, os blocos fundamentais das estruturas de larga escala são os halos de matéria negra (DM) onde as galáxias são formadas e evoluem. Contudo, apesar da importância fundamental da DM no nosso modelo teórico do Universo, nós desconhecemos qual é o perfil dos halos de matéria negra em galáxias próximas – anãs ultra-ténues (UFDs).

A análise do perfil destes halos serve também como um teste decisivo à física da DM. O modelo standard de matéria negra fria (CDM) genericamente prediz (cfr. [1]) que os halos de DM apresentem um perfil de densidade central pronunciada, que diverge de acordo com r-1 em regiões interiores, sendo correctamente modelado por um perfil Navarro-Frenk-White (NFW).

Contrastando fortemente com as previsões do CDM estão observações de galáxias anãs clássicas, que mostram fortes evidências de um núcleo central ([1,2]). Estes núcleos podem ser explicados por “outflows” relacionados com processos físicos da massa bariónica das anãs mais massivas mas podem também ser indicações de DM diferente do CDM canónico ([1,3]). A solução para este problema, e portanto restringir a natureza da DM, é estudar os perfis de densidade de anãs menos massivas – o que até à data foi feito apenas por Draco ([4]). Com este projecto iremos alargar a amostra de galáxias disponíveis uma ordem de magnitude.

Esta falta de conhecimento da DM impede também a profunda compreensão da formação galáctica. Este é um processo físico multi-facetado e, embora a última década tenha levado ao desenvolvimento de uma imagem abrangente que oferece uma descrição razoável de como galáxias se formam e evoluem, existe uma forte dependência de modelos “sub-grid” para física elementar que não é de todo bem compreendida (ex, [5]).

O ingrediente principal para os modelos actuais de formação galáctica é a noção de que galáxias típicas são sistemas em equilíbrio (ex. [6]), onde matéria acretada pelas galáxias é em média balanceada pelo “feedback” da formação estelar e actividade nuclear. Embora a ideia seja atraente, existem várias combinações de parâmetros que reproduzem as propriedades integradas galácticas; para quebrar esta degenerescência é necessário considerar propriedades resolvidas. Em particular, a distribuição de elementos pesados e a sua evolução pode ser um parâmetro sensível a prescrições de feedback [7]. Contudo, medir este parâmetro para uma amostra substancial numa janela suficientemente abrangente em desvio para o vermelho (z), imperativo para testar modelos de formação galáctica, é extremamente desafiador.

Em z=0 os gradientes de abundância (Z-gradients) estão bem estudados e em média galáxias mostram abundâncias decrescentes em direcção à periferia com baixa dispersão ([8]). A alto z as amostras são significativamente mais pequenas e a situação muito menos evidente. A z>2 existem alegações de um número substancial de galáxias apresentando baixas abundâncias em regiões centrais comparado com regiões periféricas (ex. [9]) enquanto que a 0.1<z<0.8 o nosso rastreio pioneiro mostra uma imagem mista ([10]).

Este projecto irá fornecer novas restrições para propriedades de halos de DM das galáxias mais ténues do Universo, colocar limitações nas propriedades de DM e na física de feedback, construindo um censo compreensivo de Z-gradients em galáxias até z=1.5 e até massas estelares de 107 Msun (a baixo z).

Para tal iremos impulsionar um programa VLT de 100hr (MUSE-Faint, PI Brinchmann), 100+ noites de observações profundas com MUSE através de rastreios MUSE Guaranteed Time Observing (GTO) e espectros extra-atmosféricos obtidos com o Hubble Space Telescope (HST), Euclid e possivelmente JWST, que deverão ser lançados em 2022 e 2021, respectivamente. A nossa equipa tem experiência demonstrada através de um número significativo de artigos publicados nos últimos anos, como detalhado na revisão literária.

O rastreio MUSE-Faint fornece espectroscopia profunda de UFDs, permitindo realizar o primeiro rastreio de perfis de densidade nos halos de DM com menor massa, fornecendo novas restrições a candidatos de DM, além de oferecer uma visão detalhada dos resultados de formação de galáxias em ambientes fortemente dominados por DM. As observações do MUSE GTO encontram-se em áreas com ampla cobertura pelo HST, onde a maioria já possui dados espectroscópicos (ex. [11]). A região mais bem estudada, o HST UDF, também terá espectros profundos obtidos com o Euclid e, provavelmente, com o JWST NIRISS. Para explorar estes dados, desenvolveremos pela primeira vez uma metodologia rigorosa para combinar espectros de campo integral (IFS) baseados em Terra com espectros espacialmente resolvidos baseados no espaço, expandindo o nosso trabalho em [12], o que nos permitirá estudar a evolução de gradientes metálicos em galáxias de z=1.5 até hoje.

Finalmente, iniciaremos o desenvolvimento da próxima geração de espectrógrafos panorâmicos de IFS através do nosso envolvimento no BlueMUSE.